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21 janeiro 2005

Referências Pessoais

O Rafael Galvão postou um texto sobre as obras de Jorge Amado. Falou a respeito da sua admiração pela obra dele que considera ser um dos melhores escritores do Brasil do século XX. Comentei que ao ler "Terras do Sem Fim" achei Jorge Amado um grande escritor, mas que a medida que conheci outras obras o meu entusiasmo foi diminuindo. Achei-o repetitivo. Continuando o assunto em um outro post o Rafael rebateu dizendo que de fato havia repetições em sua obra, mas que isso não necessariamente representava um problema.

Enfim, esta história toda me fez pensar em como nossas referências pessoais influenciam nossa visão crítica de uma obra ou de um autor. Somos levados a relevar os erros de uma obra se identificamos nela certas afinidades. Talvez a maior das referências pessoais que carregamos conosco e que valorizamos é a referência geográfica. Quando um escritor fala de algum lugar que nos é próximo geograficamente, isso automaticamente chama a nossa atenção. Quando lemos a descrição de algum lugar numa obra, vez por outra fazemos comentários do tipo: "Ah, esse lugar eu conheço!" ou algo assim. Automaticamente essa sensação é passada ao falar das pessoas deste lugar. Já falei aqui sobre Guimarães Rosa e como o seu linguajar me atrai, pelo fato simples de que já morei no interior de Minas e aquele "idioma" escrito em "Grande Sertão: Veredas" me é muito familiar. Faz-me voltar ao passado, criando uma certa nostalgia. Daí, quando alguém diz que não gosta de Guimarães Rosa justamente por causa da sua forma de escrever, eu não consigo compreender como a pessoa não pode gostar daquela escrita. A distância geográfica às vezes causa um estranhamento e o linguajar da obra se torna chata. Acho que é isso o que faz algumas pessoas não gostarem da forma como Guimarães Rosa escreve.

Já escrevi aqui também a respeito da minha admiração pelas obras de Pedro Nava. Suas memórias são uma viagem por uma cidade que não conheci, a Belo Horizonte do começo até o meio do século 20. Conheço Belo Horizonte hoje e quando leio a respeito da magia de certos lugares que hoje já não existem ou que perderam completamente seus atrativos, sinto uma vontade enorme de ter vivido aquela época e de ter conhecido tais lugares. Esta é também outra referência que nos atrai quase sempre: a referência temporal (não encontrei outro nome para isso, mas se refere aquela sensação de que o tempo da obra cria um "clima", sabem como?). O tempo é um troço engraçado. Vivemos hoje como se fosse algo extremamente normal. Nossa época parece que não tem nenhum grande atrativo e ao lermos sobre o passado, imaginamos mil e uma coisa e parece que tudo ali era melhor e grandioso. Só que daqui a 50 anos talvez as pessoas lerão sobre nossa época e provavelmente sentirão a mesma sensação. Nossa tendência é sempre supervalorizar o passado. Mas, convenhamos, essa sensação de nostalgia literária é uma delícia.

Por essas e outras é que cheguei a conclusão de que não tinha muita paciência com as repetições de Jorge Amado por não ter uma proximidade, nem geográfica, nem temporal, com a Bahia e os baianos. Com os mineiros tudo é diferente. Minha lista de leituras que não canso de reler possui nomes como Cyro dos Anjos, Fernando Sabino, Aníbal Machado, Carlos Drummond de Andrade, Roberto Drummond... Podem falar mal deles, muitas vezes até com razão, mas eu sempre os defendo, assim como o Rafael defende Jorge Amado. Essa "bagagem" nos faz ter sempre algo de especial a dizer sobre um autor que "bate" com nossas referências pessoais.
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